Nutrição rumo ao Powerman Brasil: como se hidratar durante a prova

Atualizado em 20 de setembro de 2016
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por Debora Finger

A hidratação é certamente a área mais negligenciada pelo atleta na nutrição esportiva. Se a nutricionista que o acompanha solicitar a ele que acorde às 3h da madrugada para tomar uma batida de whey, claras de ovo e pó de batata-doce, ele assim o fará. Mas ela que experimente pedir ao seu atleta que tome 500ml de água duas horas antes do treinamento, se programe para ingerir 200ml a cada 20 minutos de exercício e ainda reponha 1,5L de água a cada kg perdido após terminar o treino. Ele esquecerá! E esquecerá por um motivo somente: não se acredita na real influência da água (ou melhor do estado de hidratação do indivíduo) na performance final e/ou nos níveis de recuperação.

Tão importante quanto recuperar as reservas de glicogênio depletadas com o exercício – ingerindo no período pós-treino uma refeição rica em carboidrato e proteínas de alto valor biológico – é recuperar suas reservas hidroeletrolíticas. Quando treinamos em ambientes muito quentes e úmidos, temos uma perda de líquidos significativa que pode, se não houver a reposição adequada, levar a um quadro de desidratação. A perda de 2% do peso corporal já tem efeito deletério sobre o desempenho do atleta. Quando a perda é maior do que 5% a reposição das reservas hídricas pode levar de 2 a 3 dias – e não pense que isso é difícil de acontecer: para uma mulher de 54kg, esses 5% representam 2,7 kg água e essa quantidade é facilmente perdida por muitos atletas. Recuperar as reservas em 2 – 3 dias significa que todos os treinos (e eventualmente, competições) subsequentes serão realizados num estado de desidratação. Diversos estudos atuais tem demostrado que a desidratação pode não só diminuir a força muscular, como aumentar o risco de câimbras (a maior parte das câimbras não são oriundas da falta de potássio como muitos acreditam, e sim de níveis inadequados de hidratação ao iniciar o exercício). Consequentemente, a desidratação pode levar o indivíduo à fadiga precoce e pode assim, diminuir drasticamente o desempenho final. E ai vem a pergunta, é tão difícil assim tomar água?

E como hidratar-se corretamente? Não adianta sair por ai virando um galão de 5L de água desesperadamente (e muito menos fazer isso antes de uma competição visando um bom resultado). Resumidamente, podemos dizer que as recomendações se dividem em pré, durante e pós-treino/prova.

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A maior preocupação no pré-treino ou pré-prova (tudo o que vale para o treino, obviamente se aplica na prova também) é ingerir o suficiente para iniciar o exercício euhidratado e garantir um volume residual mínimo, necessário para um esvaziamento gástrico mais efetivo durante o treinamento. Em outras palavras, é necessário ter uma certa quantidade de água já no estômago no período anterior ao exercício, para que os líquidos que forem ingeridos durante esse exercício sejam de fato aproveitados. O efetivo aproveitamento do líquido suplementado só ocorrerá assim que este passar pelo estômago e ser absorvido ao chegar no intestino, e a velocidade desse efluxo gástrico vai depender da efetividade do esvaziamento gástrico. Então, de duas a quatro horas antes do treino/competição, não esqueça de beber água! A recomendação da ACSM (American College of Sports Medicine) é de 5 – 10 mL/kg peso. Um atleta de 70 kg, por exemplo, terá que ingerir de 350 a 700 mL de água nesse período pré-exercício.

Durante o treino/prova, é necessário repor os eletrólitos e líquidos que estão sendo perdidos com a sudorese. Nesse caso, as quantidades e o tipo de bebida vão variar de acordo com o tipo de exercício, a intensidade e a duração que o indivíduo esteja realizando. Pode ser interessante adicionar algum carboidrato à água para acelerar a absorção ou talvez seja necessário repor o sódio de uma forma mais agressiva (ex: cápsula de sal). A literatura recomenda que a reposição hídrica seja de 0,4 – 0,8 L por hora de exercício, ou seja, o mínimo que você deveria beber é 400 mL/hora. O ideal é que sejam ingeridos pequenos volumes (100 – 200ml) a cada 15-20min.

No Powerman, a sua hidratação deve começar na primeira corrida. Tome pequenos goles nos postos de hidratação da corrida (ou pelo menos faça um bochecho e jogue fora). Na perna da bike é muito importante se hidratar bem e planejar bem sua estratégia. De fato, em provas longas de endurance, como o Powerman, a primeira regra é: você deve ter mais de um suporte para caramanhola na sua bicicleta. Esse ano o trajeto do Powerman deve sofrer algumas alterações, mas como ainda são informações não oficiais vamos aguardar a organização da prova se pronunciar. Mas enfim, conhecendo a dinâmica da prova e onde se localiza o posto de hidratação no ciclismo (ano passado existia um posto só, mas dos dois lado da via, e como eram duas voltas, tínhamos quatro oportunidades de hidratação), digo-lhes que o ideal é levar, pelo menos, uma caramanhola com algum tipo de carboidrato (converse com a sua nutri e escolha aquele que vocês julgarem mais interessante) e outra caramanhola (mais simples) com água. Digo “mais simples” pois a organização pode lhe entregar uma caramanhola cheia de água e você pode ter que tirar a sua caramanhola própria e jogá-la fora. Não é nada legal ter que lidar com um “Good bye Camelbak – e meus 100 pila investidos nela” no meio da prova. Em 2015 a organização da prova entregava a água em garrafas plásticas de 500mL, dessas que a gente encontra em mercado. No Challenge ganhávamos caramanholas já cheias de água ou isotônico.

Se o Powerman mantiver a logística do ano passado, e se você realmente receber uma garrafa de água normal, o ideal seria ter um aerodrink para que você possa transferir a água da garrafa para o seu aerodrink. Obviamente é aconselhável que você treine essa manobra. Transferir a água de uma garrafa PET para o aerodrink não tem mistério, já que a maioria dos modelos vem com uma abertura relativamente grande justamente para esse fim, mas isso deve ser treinado. Tombos nesses momentos são super corriqueiros. Se você não tiver um aerodrink, vai conseguir apenas tomar alguns goles da água que receber e terá que descartar a garrafa imediatamente. Assim sendo, é importante que você mantenha a concentração pois perder uma chance pode acabar custando caro.

Tendo como exemplo a prova do ano passado e o chuvaréu que foi, temos um outro problema. Na chuva é ainda mais difícil do atleta lembrar-se de ingerir água. Ele não sente sede e se não sente, não bebe água. Ok, a taxa de sudorese certamente vai ser menor, mas isso não é motivo para não beber água. Pode-se até reduzir um pouco o consumo, mas não completamente.

Depois do treino/prova, e dependendo da taxa de suor que foi produzida, é extremamente necessário repor os principais eletrólitos perdidos no suor (principalmente sódio e potássio). Para esses momentos a indústria criou os isotônicos. Você pode utilizar um isotônico natural como a água de coco (riquíssima em potássio e com boa concentração de sódio) ou pode recorrer às marcas comerciais já conhecidas. Nesse momento, outro detalhe deve ser levado em consideração. O Powerman, como prova longa que é, certamente vai levar os atletas a ter uma perda muito significativa de eletrólitos. A concentração sanguínea de sódio pode, nesses casos, baixar a níveis tão baixos a ponto de gerar uma hiponatremia (quando a concentração plasmática encontra-s ea níveis baixos demais). Por isso, é importante que, ao finalizar a prova, o atleta não beba água pura (o que diluiria ainda mais a concentração de sódio) e sim repositores hidroeletrolíticos. A hiponatremia pode ter sintomas leves e imperceptíveis ao atleta, mas em situações mais extremas, pode levar, inclusive, ao coma e à morte. É preciso ter cuidado! Você vai precisar da água antes e durante a prova, mas ao terminar, dê preferência aos isotônicos ou bebidas que contenham eletrólitos.

Novamente, a recomendação aqui é expressiva. A ACSM recomenda uma ingestão de 1,25 – 1,5L de líquidos por kg perdido (com a sudorese). Como a taxa de suor é muito individual, o ideal seria que previamente ao dia da prova você já tivesse se pesado antes e depois do treino para ter uma ideia de quanto perde com o exercício. Se você sabe que perde cerca de 3L, deveria nessas primeiras horas pós- atividade ingerir cerca de 3,75 – 4,5L de líquidos. Mas levando em consideração que pouquíssimos atletas fazem esse teste (embora ainda tenhamos tempo para isso, ainda estamos há 2 meses e meio da prova) esse é o momento de se hidratar ao máximo possível, e se for pecar por excesso, que seja agora e não antes ou durante o exercício.

Uma hidratação eficiente garante a condição ideal para que o atleta mantenha sua capacidade física, equilibrando a homeostase hidroeletrolítica e fornecendo um cenário propício para uma alta performance. Planejar a hidratação é essencial! Dê a ela o seu devido valor!

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debora2Débora Finger é Duatleta e nutricionista do desbananandoteorias.com.br. Contato: deh_saoleo@hotmail.com