Meninas são menos competitivas?

Atualizado em 29 de junho de 2017

Por Fernanda Silva

As diferenças tanto físicas quanto psicológicas entre homens e mulheres na corrida sempre foram motivo para discussões. Recentemente, um artigo publicado por uma conceituada revista americana reuniu algumas pesquisas sobre o assunto, gerando a questão: as mulheres são menos competitivas do que os homens? O primeiro a analisar foi o psicólogo esportivo americano Robert Deaner. Há seis anos, ele iniciou diversos estudos para determinar se as mulheres são mesmo menos competitivas. Para isso, analisou o nível de competitividade entre os dez primeiros colocados nos rankings masculino e feminino. A diferença de tempo entre a décima colocada e a vencedora chega a 15%, enquanto entre os homens o percentual cai para 10%.

Um estudo da Medicine & Science in Sports & Exercise (MSSE), com dados de mais de 30 anos da Maratona de Nova York, confirmou as análises do psicólogo. Um terço da diferença entre os resultados de homens e mulheres nas corridas é devido à baixa participação feminina. Conclusão: quanto mais corredoras participarem das provas, maior será a competitividade.

A boa notícia é que a participação feminina em corridas de rua tem crescido ano a ano. Tomando por base os períodos de 1980-1985 e 2006-2010, as pesquisadoras do estudo acima descobriram que o aumento da participação feminina na faixa etária entre 30 e 39 anos dobrou, saltando de 15,4% para 36,6%. Com isso, a tendência é que o nível de competitividade entre elas aumente a cada ano.

Coisas de mulher
Para a psicóloga esportiva Carla Di Pierro, um dos fatores que justifica a menor participação feminina é o, relativamente, pouco tempo em que elas começaram a participar das corridas. Até 1967, quando Kathrine Switzer entrou de “penetra” na Maratona de Boston, apenas os homens podiam participar de maratonas. “Nós mulheres éramos proibidas de praticar esporte há algumas décadas. Hoje, apesar da igualdade, ainda há menos mulheres em todos os esportes”, explica.
As características biomecânicas também devem ser levadas em consideração. “A estrutura masculina foi projetada para lutar e proteger sua família, o que lhe dá vantagens físicas. Mas, entre si, as mulheres podem ser muito competitivas – mais do que os homens. Vai da particularidade e história de vida de cada uma”, avalia.
Além disso, a testosterona — hormônio esteroide presente em maior quantidade nos homens — traz mais agressividade, vigor e competitividade. Por isso é comum ver um corredor – mesmo despreparado – se superando para ultrapassar uma mulher. “Muitos homens já se incomodaram quando os ultrapassei em uma prova. Me diziam que eu estava indo forte demais e poderia me prejudicar”, conta Larissa Lima, especialista em fisiologia do exercício. O psicológico também influencia: os homens confiam mais do que deveriam no próprio taco. Há ainda o fator cultural. A sociedade espera dos homens ousadia e enfrentamento, e da mulher, delicadeza. Isso causa essa discrepância de comportamento.

Por outro lado…
Hoje em dia, a igualdade entre os sexos está bem maior e pode ser notada em praticamente todos os setores, respeitadas as características e limitações de cada um. Para Larissa, mesmo que as pesquisas mostrem o contrário, há muita competição entre as próprias mulheres. “Apesar de ser de uma forma mais comedida, acredito que haja muita disputa entre nós mesmas. Muito mais do que com os homens, em que há uma competição mais prudente, respeitando mais os limites”, afirma a treinadora.
Falando da parte emocional, é notável que as mulheres não deixem a desejar nos quesitos garra e determinação. Atletas como Gabrielle Andersen-Scheiss, Paula Radcliffe e Carmem de Oliveira Furtado, além das grandes corredoras da atualidade, mostram como o lado psicológico feminino pode ser tão forte quanto a força masculina. “Atendo atletas de alta performance há muito tempo, como a maratonista olímpica Adriana Aparecida da Silva e a maratonista aquática Ana Marcela Cunha, e o que posso dizer é que poucos homens são tão competitivos quanto essas duas mulheres”, conta Carla Di Pierro.

Vale para todos
Independentemente dos estudos, pesquisas, diferenças físicas e biomecânicas, tanto as mulheres como os homens precisam de foco, planejamento e treinamento para chegar aonde desejam. “O nível de competição depende do valor e do significado que a atleta coloca em seu objetivo e o quanto se compromete para alcançá-lo. Isso vale também para os corredores”, calcula a psicóloga. A treinadora Larissa Lima concorda com Carla, e reforça: “Com treinamento individualizado e um bom planejamento, tanto mulheres como homens podem atingir suas metas na corrida”.

(Matéria publicada na Revista O2 – edição #120 – abril de 2013)