História de atleta: volta solitária ao mundo

Atualizado em 20 de abril de 2016
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O velejador argentino radicado no Brasil, Matias Eli, 38 anos, largou o emprego para realizar um sonho de infância: dar a volta ao mundo sozinho a bordo de um veleiro. Inspirado nas narrativas em livros de grandes aventureiros, como Amir Klink, Matias deve concluir sua grande jornada em 2010.

A aventura começou no início de 2008, em Ubatuba (SP), a bordo do seu veleiro Bravo, um modelo MB45, e até agora o velejador já percorreu 11.900 milhas náuticas, visitou 11 países e parou em 35 lugares que considera paradisíacos.

Atualmente, Matias está em sua casa em São Paulo no Brasil para uma pausa estratégica, onde concedeu esta entrevista para o ativo.com. Matias está aqui para matar a saudade de sua família – especialmente a mulher e as filhas – e aguardar o fim da temporada de furacões, para poder retomar a jornada no mês de abril. Nessa segunda fase de navegação, Matias irá partir das ilhas Fiji e retornará ao Brasil, no mês de dezembro.

O sonho de Matias começou há bastante tempo, ainda na época que cursava faculdade de Administração na PUC, em São Paulo. A sua relação com o mar e barcos, contudo, é mais antiga ainda, teve início na infância, quando já disputava regatas na categoria amadora e costumava velejar com o pai na represa de Guarapiranga. As férias sempre foram a bordo de um veleiro de 40 pés que o pai tinha no litoral.

“Nesta época era mais uma vontade de ter independência, liberdade, aquela típica revolta adolescente, e a forma que eu visualizava isso era vivendo em um barco. Hoje em dia, na verdade, existem poucas formas de você realmente viajar com liberdade, como é possível com um barco”, diz.

Ele precisou de 15 anos para ganhar e rentabilizar o dinheiro necessário para fazer a viagem, o que conseguiu trabalhando no mercado financeiro, contratado pelo banco australiano Macquarie Bank. A decisão de largar o emprego e realizar o seu sonho veio junto com a crise financeira entre 2007 e 2008. “O tamanho da crise, que vinha se aproximando, facilitou muito a minha decisão de sair do banco, era hora de soltar as amarras e partir”, conta.     

Da demissão até o início da viagem, Matias demorou pouco mais de um mês. Em julho de 2008, ele, sua esposa e as duas filhas já estavam no barco. A idéia inicial era que toda a família seguisse viagem, mas sua esposa percebeu que não conseguiria fazer o roteiro com a filha de apenas seis meses. Mesmo com a desistência da esposa, o velejador seguiu sozinho na volta ao mundo. Mas sempre que possível a família o encontra.

Para fazer a volta ao mundo, Matias escolheu a rota equatorial, passando pelo canal do Panamá e Polinésia na ida. Matias embarcou com esta macro rota definida, mas foi decidindo as paradas aos poucos, durante a viagem. Matias já concluiu 50% do roteiro a bordo do seu barco fabricado no Brasil em 1989.

Matias diz que o tempo de preparação do barco para viajar já foi um treinamento técnico para encarar o mar sozinho, pois acompanhou de perto os preparos em Ubatuba, onde estava o barco. “La fora a mão de obra não é barata, então sabia que precisava conhecer o barco sozinho muito bem para cuidar dele o mais independente possível”. 

Sozinho no comando do veleiro, Matias aperfeiçoou seus conhecimentos de mecânica e manutenção do veleiro, navegar por 24 horas e lidar com a solidão. “Aprendi a achar a rotina importante. A rotina no barco organiza o meu dia, me ocupa. Num barco você fica muito ocioso e o tempo deve ser bem aproveitado”.

Um dos pontos altos da grande aventura até o momento foi fazer a travessia do oceano Pacífico sozinho. Nessa travessia, Matias Eli enfrentou 17 dias de navegação ininterruptos, de Galápagos até a Polinésia Francesa. “Os primeiros dias são mais difíceis, depois você entra na rotina e também num estado de atenção diferente, você começa perceber as coisas pelo barulho, pelo andamento do barco, você fica muito integrado entre o barco e o meio ambiente. Depois dos primeiros dias eu já conseguia dormir até três horas seguidas, acordava, olhava se estava no caminho, verificava as velas e voltava a dormir”, conta. 

Apesar das belas paisagens desta jornada solitária pelo pacífico, a história mais inesquecível para Matias foi numa Ilha entre Cartagena, onde estava, e San Blas, no Panamá, seu destino. No dia 19 de julho era o aniversário de sua mulher e ele queria parar em terra firme para ligar ao Brasil. Conhecidos da viagem garantiram que uma ilha panamenha no meio do caminho teria Internet, porém só havia índios Kuna, que sequer falavam espanhol.

“Eles me olhavam sem entender o que eu estava fazendo ali, mas quando me fiz entender que era brasileiro, um índio veio falar comigo em português, ele era professor de educação física, havia feito o curso na Universidade Federal do Rio de Janeiro, e dava aula para crianças na aldeia. Por fim fiquei dois dias nesta ilha e acabei levando as crianças da aldeia para velejar. E consegui fazer uma ligação a cobrar via Embratel para minha mulher no Brasil”, conta.

O mais interessante é que Matias não tem muitas fotos de suas aventuras, viajou apenas com uma máquina fotográfica pequena que não usou com muito afinco, pois a viagem para ele era realmente uma jornada pessoal. “Eu não tinha interesse nenhum em divulgar a viagem, o que eu tinha na minha mente era o desafio pessoal e também esportivo, pois eu trato a travessia de uma forma diferente da maioria dos cruzeiristas… eu gosto de fazer o barco andar, venho das competições de regatas, eu sempre gostei de performance, e tê-la em mente na viagem também é uma forma de eu me ocupar”.  

O mar e a rotina solitária no barco trouxeram grandes lições para o velejador. “Agora eu estou mais preocupado com a minha saúde. Antes não tinha essa preocupação. Também estou mais autoconfiante. Depois de uma experiência como essa você percebe que é capaz de fazer quase tudo”.

 

História de Atleta – No relato anterior, confira a incrível história do triatleta Erick Vasconcelos, que começou no Triathlon pelo Ironman.

 

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