Poliana Okimoto, a maratonista das águas

Atualizado em 20 de setembro de 2016

A mulher faz uma maratona em 1h50min!!!! Com um porém: a maratona dela tem apenas dez quilômetros; e mais outro porém: não é em terra firme, é nas águas salgadas e mexidas do mar do Rio de Janeiro.

Estou falando de Poliana Okimoto, medalha de bronze na maratona aquática nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, primeira mulher a conquistar para o Brasil uma medalha olímpica em esportes aquáticos.

Poliana tem uma longa e vitoriosa trajetória em maratonas aquáticos. Em 2009, quando ela se tornou campeã do mundo, eu fiz uma longa entrevista com ela, publicada no blog “+Corrida”, que eu produzia para o portal da “Folha de S. Paulo”.

Considerando que, nas águas ou em terra, Poliana é uma maratonista, alguém que se dedica a mostrar que é mais resistente do que a distância, mais determinada do que o sofrimento, trago para você agora alguns trechos daquela entrevista.

RODOLFO LUCENA – Maratonista das águas escolhe prova? Há quem goste mais de mar mexido e quem só nade em águas calmas?

POLIANA OKIMOTO – Antigamente, eu tinha muito medo de nadar no mar agitado ou num mar frio, porque eu sou muito magra [NR.: 1,68 m, 45 kg], então eu sinto muito o mar frio e não tenho muita massa muscular, então eu também sinto muito para passar nas ondas. Quem é um pouquinho mais gordo e tem uma massa muscular maior que a minha, vai ultrapassar as ondas mais facilmente e vai suportar o frio mais fácil do que eu. São essas as características que a gente consegue definir antes da prova, mas uma prova de maratona clássica é totalmente misteriosa, a gente nunca sabe quem vai ganhar. A gente nunca sabe o que pode acontecer durante uma prova. O contato físico é muito grande. Uma cotovelada que você leve no meio da prova, que você fique sem ar, você vai lá para o último e não consegue ter um rendimento tão bom na prova.

Contato físico na largada ou na prova inteira?

Na prova inteira, desde a largada até a última braçada. Pontapé, cotovelada, eu já tive um tímpano perfurado, tive que fazer cirurgia para a reconstrução do tímpano.

Como isso aconteceu?

Foi em 2006, na minha primeira participação em campeonato mundial. Eu estava totalmente crua, não sabia direito o que acontecia e, na largada, eu tomei uma cotovelada no ouvido. Fiquei totalmente zonza, tonta, não sabia direito se eu continuava, se eu parava… Fui lá para o último trigésimo, quadragésimo, até eu conseguir retomar meus pensamentos e saber o que eu tinha que fazer. Eu queria muito participar desse campeonato mundial e queria muito ganhar uma medalha. Eu já tinha ganhado uma medalha de prata nos 5 km. Então, nos 10 km eu já fui mais visada, as pessoas na largada já me olharam diferente. Mas continuei a nadar, consegui buscar as primeiras colocadas e fiquei em segundo. Depois fiquei sabendo que tinha perfurado um quarto do tímpano. Tive que fazer cirurgia, fiquei dois meses fora de treino, quatro meses fora de competição. É sempre um risco quando você entra para um prova, justamente, por isso, pelo contato físico intenso que tem durante a prova.

E como você chegou à maratona? Você começou a nadar ainda bebê, não é?

Comecei com dois anos. Comecei porque minha mãe tinha muito medo de mar, que os filhos se afogassem, e colocou eu e meu irmão mais velho para nadar. E com sete anos entrei no treinamento. Eu era horrível. Era uma das últimas a chegar, porque na época só tinha provas de 50 metros e cem metros. A partir do momento que começaram as provas mais longas, 400, 800, 1.500 metros, eu comecei a me destacar.

Mas isso já adolescente?

Isso já com 12 anos. Com 13 anos, eu ganhei uma medalha do Troféu Brasil, fui uma das mais jovens atletas a ganhar uma medalha de Campeonato Absoluto Brasileiro. Com 14, 15, 16 anos, ganhei Troféu Brasil, bati recorde brasileiro, sul-americano, participei de campeonatos mundiais, tudo em piscina. Em 2005, fiz minha primeira travessia, que foi a Travessia do Forte, no Rio de Janeiro, incentivada pelo meu treinador, que é meu marido. Um ano antes ele tinha visto essa travessia pela TV e me disse: “O ano que vem você vai estar lá”. Eu morria de medo de nadar no mar. Um dia antes da prova fui nadar no mar, não consegui nadar, saí chorando, não sabia se ia competir. Mas na hora eu fui, nadei superbem, consegui nadar no mar. Bati o recorde da prova.
Um mês antes dessa prova foi anunciado que a Maratona Aquática ia entrar nos Jogos Pan-Americanos e na Olimpíada. Isso me motivou muito a olhar a Maratona com outros olhos, até porque meu técnico sempre dizia que quanto mais longa fosse a prova melhor eu me sairia.

Você tinha medo de quê?

Eu tinha muito medo de nadar no mar, achando que os animais poderiam me atacar. Além do que as provas de maratonas são infinitamente diferentes das de piscina, pois temos que enfrentar a natureza, o mar em diversas condições climáticas (frio, muito quente, calmo ou revolto) e existe o contato físico muito grande com outras atletas.

O que a maratona tem de especial?

Ela é apaixonante porque envolve todos os públicos. Uma criança de dez anos, um senhor de 80, 60 anos pode estar nadando com a gente no circuito Brasileiro, no circuito Paulista. Na maratona, cada prova é uma prova diferente. Você chega para a prova muito adrenalizado e, quando você sai, é sempre uma vitória, porque é uma prova muito extenuante. Há o contato físico, as condições da natureza, tudo isso que envolve a Maratona Aquática, quando você sai da prova você sai se sentindo bem, se sentindo uma pessoa mais forte, uma pessoa vencedora, mesmo que você não tenha ganho a prova. Você se sente vencedor só por ter terminado uma prova de 10 km e até hoje todas as provas que eu faço, eu saio assim, independente do resultado que eu tenha. É viciante.