Maratona de Chicago 2016 é a mais lenta do século

Atualizado em 10 de outubro de 2016
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Não sei se já contei para você, mas, se não contei, aqui vai um segredo exclusivo para seus olhos: eu adoro Chicago.

Foi a primeira cidade que visitei na minha primeira visita aos Estados Unidos, em meados dos anos 1980. Fiquei impressionado com a variedade e a monumentalidade da arquitetura, com os fantásticos parques e suas esculturas fenomenais, com os apaixonantes museus, com o carinho com que são tratadas as águas – rios e o lago Michigan.

Adorei correr nas ruas de Chicago e me esbaldei nas corridas que por lá fiz – uma delas, deliciosíssima, dedicado ao chocolate.

Vai daí que sou fã da Maratona de Chicago, tal e qual a cidade é fã de sua corrida – a TV local faz uma das melhores coberturas jornalísticas de maratona que já pude acompanhar. Além da beleza do circuito, o trajeto é muito rápido, tanto que já foi palco de recordes mundiais.

Por isso me assustei quando, na tarde do último domingo, fui ver os resultados da  Maratona de Chicago. “Será que saiu recorde mundial, e eu não estou sabendo?”, é a pergunta que sempre me vem à mente nesses momentos, antes de abrir o noticiário na internet.

Ledo e ivo engano. O bicampeão mundial da maratona, Abel Kirui, que tem 2h06min51 como melhor tempo e a qualquer hora corre a maratona em duas horas e oito minutos sem suar, passou das duas horas e onze minutos para vencer uma das seis maratonas mais importantes do mundo. Que lerdeza, meu senhor!!!

Logo imaginei que tinha havido algum desastre – não acompanhei a prova ao vivo -, talvez temperatura alta de mais.

Que nada!

O que acontece é que, sem coelhos pelo segundo ano seguido, os corredores de elite – a elite que sobrou depois dos Jogos Olímpicos e dos estrelados pelotões de Londres e Berlim – ficaram sem saber direito o que fazer na Maratona de Chicago.

A frase acima pode parecer heresia, pois estamos falando de alguns dos mais experientes e bem treinados maratonistas que o mundo já viu.

 

 

O fato, porém, é que eles não conseguiram manter um ritmo decente, ficaram se estudando por 10 km – passaram a marca com mais de 32 minutos, coisa de colegiais — e depois tiveram rompantes, escapadas e declínios, numa espécie de fartlek destruidor de músculos e mentes.

Cruzaram pela marca da meia-maratona em 1h06min50, e fizeram da milha 18 à milha 20 num ritmo inferior ao das mulheres (que não também não foi a melhor coisa do mundo, mas esteve mais dentro da normalidade das grandes maratonas).

Com isso, o mínimo que os líderes podiam fazer é oferecer uma boa briga na chegada. O que de fato aconteceu, com Kirui e seu compatriota Dickson Chumba, cinco anos mais novo, duelando de forma entusiástica – o mais jovem chegou três segundos atrás do campeão.

O que não ofusca o insofismável fato do altíssimo tempo. A chegada em 2h11min23s não só faz a Maratona de Chicago 2016 a mais lerda edição deste século como também  a pior desde 1993 – em mais de 20 anos, portanto.

O resultado já suscita especulações entre fãs de corrida, que criticam os organizadores por não colocarem marcadores de ritmo para a elite. Em sites especializados, como o “Letsrun.com”, já surgem debates considerando se Chicago deve manter seu posto entre as Majors (as seis maiores maratonas do mundo).

Por desempenho, a posição não se sustenta. Basta dizer que, no mesmo último domingo, na muito menor maratona de Eindhoven, na Holanda, um maratonista debutante venceu com o razoável tempo de 2h06min26s.

Aos 21 anos, o queniano Festus Talam, dono da marca de 1h01min48s, fora contratado como “coelho” (marcador de ritmo). Deveria levar os corredores de elite até o km 35 num ritmo que previsse final da maratona na casa das duas horas e seis minutos.

Na altura do km 30, porém, apenas dois contendores acompanhavam a balada; mesmo assim, já davam sinais de fraqueza.

Quando viu que estava sozinho ao terminar sua tarefa, Talam pensou com os cadarços de seus tênis: “Não tem tu, vai tu mesmo!” e se mandou.

Se estivesse na mesma corrida que Abel Kirui, o campeão de Chicago estaria cerca de um quilômetro e meio distante quando o campeão de Eindhoven cruzasse a linha de chegada.