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Por bem ou mal, correr sempre te impacta de alguma forma

Atualizado em 13 de novembro de 2017
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Se eu te perguntasse quantas vezes você correu na última semana, você provavelmente responderia três, quatro, talvez até cinco; um ou outro louco, seis.

Agora, se eu te perguntar quantas vezes você transou na última semana (não vale para quem começou a namorar há menos de dois meses), acho que o volume perde para a corrida. Donde se conclui que correr é melhor que fazer essa outra coisa. Olha, dependendo de como foi essa outra coisa, é sim.

Porque a pior corrida, aquela que menos rende, a mais lenta, a mais monótona, num calor senegalês, na solidão, é boa. Há até uma explicação hormonal, como a liberação da endorfina, adrenalina e blá-blá-blá. Tanto faz. Já o pior sexo é o pior sexo e ponto.

A corrida sempre causa algum efeito. Ela nunca é ignorada. E cada pessoa a sente de um jeito. Para cada um de nós, ela dá seu alô de uma maneira diferente. Outro dia, por exemplo, encontrei uma amiga no final do treino dela. O “diálogo” foi assim:

— Oi-Anne-fiz-12-em-1h-e-fiz-em-jejum-mas-num-tô-cansada-nem-com-fome-porque-ontem-comi-demais-você-vai-fazer-quanto-tchau!!!!

Quando ela respirou, eu aproveitei para dar tchau e continuar meu treino. Achei ótimo. Detesto ficar de trololó, ainda mais quando a pessoa fica passando recibo de treino. A questão é: para essa colega atleta, a corrida dá um ânimo tal que ela não para de falar. Tem quem cante, dance. Uma amiga tem ataque de risada. Conheço um sujeito que precisa deitar, na rua mesmo. E já corri com um treinador que quando termina, ele para totalmente, estanca o corpo onde quer que esteja. Cada um no seu quadrado.

 

 

Em geral, eu fico criativa. Penso em textos mirabolantes, tenho ideias para desatar nós do trabalho, entrevisto mentalmente Deus, elaboro o que falar para meu filho em caso de nota boa e em todas as vezes que ele fica abaixo da média.

Também já fiquei deprê e cheguei ao ponto de hidratação da equipe chutando a santa. O treinador olhou dentro da minha alma e disse: “Calma, essa tristeza é normal em treino com mais de 2 horas. É sua cabeça pedindo para parar”. Mas quando ele falou isso já era tarde demais. Eu já tinha xingado ele de uns dez palavrões bem cabeludos e de tranças, tadinho.

O mais legal é que é praticamente impossível voltar para casa igual a quando você saiu quando foi correr. Você pode até voltar chateado, frustrado. Sujo, molhado, suado. Meio torto, vesgo, trocando as pernas. Mas nunca volta igual. A corrida transforma. De um cabra garboso, cheiroso, esperançoso, você vira um sujeito cansado, sujo, com fome, com sede, com ódio. De uma moça direita e valorosa, você fica fedida, cabelo desgrenhado, com o coração saltando pela boca. Isso, é claro, se for para fazer direito.

Porque a corrida te enfeia para te enfeitar. Te suja para te limpar. Te irrita para te alegrar. Te leva para o inferno para que você conheça o céu. Se não for assim, não é corrida. É brigadeiro de chocolate belga. Que também é bom, mas não muda sua alma, só seu corpo.