Temperatura negativa, escuridão e paisagens incríveis na Patagonia Run

Atualizado em 28 de abril de 2017
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As montanhas, as geleiras e os lagos da Patagônia Argentina se consolidaram como alguns dos locais mais bonitos da América do Sul e ganharam popularidade entre os amantes de esportes de aventura. Suas paisagens estonteantes ajudam a amenizar os efeitos físicos que provas muito longas costumam causar em corredores. Atraído pelas belezas da região, o empresário e produtor cultural Fábio Seixas, de 34 anos, viajou à Argentina na primeira quinzena de abril para participar da Patagonia Run, uma corrida de caminhos e trilhas de montanha que conta com sete distâncias – 10 km, 21 km, 42 km, 70 km, 100 km, 125 km e 145 km.

A largada da Patagonia Run aconteceu em San Martín de los Andes, na província de Neuquén, a 190 km de Bariloche, destino de neve favorito dos brasileiros. Fábio escolheu o trajeto de 100 km e começou sua saga patagônica na sexta-feira (7), às 21h30. A organização da prova estabelece que o percurso seja finalizado até as 23h do sábado (8). Ou seja, o empresário teve 25h30min para rodar pelas escuras montanhas argentinas durante a madrugada debaixo de um frio de – 6º C. Ele encarou a partir da largada 6.300 metros de subida em terrenos tortuosos e levou 19h02min38s para cruzar a linha de chegada da ultramaratona.

O limite de tempo faz com que os competidores tratem de economizar ao máximo tempo nas paradas para alimentação, idas ao banheiro, ajustes na lanterna e trocas de meia ou calçados, uma estratégia para preservar pés que já estão castigados. Cochilar? Nem pensar. A luta contra o relógio exige que o atleta, além de bem condicionado fisicamente, esteja alerta o tempo todo.

“O percurso inteiro é muito agradável, apesar de ser difícil. Não é monótono. Toda hora ele te apresenta um desafio diferente. Isso ajuda bastante, te mantém motivado por uma nova dificuldade, uma mudança de terreno. A cabeça está sempre ligada para solucionar os problemas. Isso é mais cansativo que a própria corrida. À noite, a parte mental, dependendo do terreno, era mais pesada. Você não consegue ver tanta coisa ao seu redor, precisa de cuidado para não pisar em buracos e para não bater a cabeça em uma árvore. Mesmo estando bem fisicamente, você acaba sentindo mais o cansaço”, ressalta Fábio.

 

 

Um dos problemas que Fábio teve que solucionar não foi seu. A organização da Patagonia Run instala postos de hidratação e alimentação de 10 km em 10 km, mas o empresário fez uma parada que não estava prevista para socorrer um competidor que sofria com a hipotermia em uma floresta. Em espanhol, levou palavras de incentivo para que o atleta vencesse o desânimo e fosse até um posto de atendimento.

O empresário teve a companhia de Jennifer Gilberg, sua namorada, que estreou nos 42 km. E ela, logo em sua primeira prova do gênero, conseguiu ficar com o sétimo melhor tempo de sua categoria: 6h21min56s.

“Não senti dificuldade nenhuma. Desde o começo eu já sabia que completaria. É uma preparação muito mental, que é o que de fato faz diferença. Vi muita gente forte parando . Tem que seguir um treinamento específico, dedicar muitas horas a isso. A cabeça tem que estar muito combinada com o treino.”

Fábio cruzou a linha de chegada com uma dúvida comum entre os participantes de ultramatona. Vale a pena correr mais rápido e chegar antes ou evitar o desgaste físico e prolongar a jornada, forçando o lado mental?

“Como eu nunca tinha feito 100 km, optei por um pace um pouco mais lento do que tinha feito na de 80 km. Não sei se usei a estratégia certa”, questionou.

Estratégias à parte, disputar uma ultramaratona pode ser uma experiência transformadora, garante ele.

Entra um Fábio na largada, sai outro na linha de chegada. Essas provas são sempre transformadoras. Mesmo com toda natureza da Patagônia – lagos, neve, florestas magníficas, pastos largos com cavalos –, o mais bonito é olhar para dentro. A vivência, se bem observada e absorvida, transforma.”