Sonho Africano: a conquista de um brasileiro na Comrades

Atualizado em 20 de abril de 2016
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O engenheiro e ultramaratonista amador Nato Amaral realizou há pouco mais de um mês o sonho que acalentou por muitos anos, o de completar 10 edições da Comrades e conquistar o Green Number, honraria concedida pela mítica ultramarona na África do Sul aos seus atletas mais persistentes. E Nato ainda tornou-se o primeiro sulamericano a receber o desejado número, conseguido com muita disciplina.

Nato ganhou destaque na revista oficial da prova e foi reconhecido e cumprimentado por outros corredores. Além da emoção de receber o Green Number, ainda fez seu melhor tempo nestes 10 anos. Porém, enquanto ainda saboreia sua conquista já traçou uma nova meta ousada, como conta em entrevista para o ativo.com

O que faz a Comrades tão especial para você?

Nato – É uma prova contagiante, envolvente, uma emoção indescritível. Eu já fiz grandes maratonas internacionais, como Nova York e Londres, mas nada se compara à Comrades. Somado a isso, fiz dezenas de amigos na África do Sul e sou sempre muito bem recebido por aquele povo caloroso e hospitaleiro. Tenho uma identidade muito forte com essa prova e não consigo ficar de fora.

Você correu na Comrades este ano com um número que o diferenciava dos demais, como foi a interação com outros corredores?

Nato – O atleta que está em sua 10ª Comrades faz a prova usando o número de inscrição em papel com fundo amarelo, para ser facilmente identificado tanto pela Organização como pelos outros atletas e o público em geral. Neste ano, correr com o número amarelo foi, para mim, uma experiência e tanto. Não foram poucas as vezes nas quais fui abordado por outros atletas na prova me parabenizando por estar completando a 10ª Comrades. Um deles, inclusive, viu que eu era brasileiro pela bandeira que uso em minha camiseta e disse que viu minha foto na revista oficial da prova.

A emoção de estar prestes a entrar para um grupo seletíssimo ajudou ou atrapalhou a corrida este ano?

Nato – Isso só ajudou, pois me motivou ainda mais a me dedicar ao máximo, com total disciplina, para conseguir o meu melhor e coroar esses 10 anos de competição. E, de fato, isso ocorreu: além de conquistar o Green Number, cruzei a linha de chegada cravando o meu recorde pessoal e estabelecendo a minha melhor marca em 8h33’53”, o que me fez vibrar e chorar ainda mais de emoção, com a minha mãe Edith, minha esposa Josi e a minha querida amiga Ciça, que me assistiam bem em frente à linha de chegada.

Além do Green Number e da espera da honraria, esta última edição foi diferente em algum outro aspecto para você? 

Nato – Uma série de aspectos tornou essa Comrades única para mim, todas elas em função da atmosfera da conquista do Green Number, desde a presença de minha família, um enorme grupo de amigos que correram a prova e outros que assistiram e torceram, as homenagens que recebi após a conquista e a realização de mostrar a muitos brasileiros que é possível chegar lá. Foi um dos dias mais felizes da minha vida e, sem dúvida, uma das minhas maiores conquistas, única, eterna. É claro que teve uma alta dose de dedicação pessoal, mas dedico a conquista do Green Number ao meu grande amigo e treinador: Branca.

Das 10 Comrades que já disputou, qual foi a mais difícil?

Nato – Em cada prova, há uma dificuldade específica. É claro que em algumas eu sofri muito mais, como em 2003 quando viajei lesionado e corri com fortes dores no joelho; e em 2010, quando comi algo que não me fez bem no café da manhã e fiz a prova inteira com cólicas estomacais, tendo que parar algumas vezes para ir ao banheiro. Ao longo desses 10 anos, eu jamais pensei em desistir, pois sempre tive muito claro e muito intenso o meu objetivo, o meu sonho. Sem dúvida tive momentos de baixa motivação e a preguiça de saber tudo o que eu tinha que enfrentar para fazer mais uma Comrades, mas nunca fui vencido. Superei essas situações, calcei meus tênis e fui pro asfalto. Treinei muito, fiz mais uma Comrades. E outra, mais outra.

A cada ano que eu me aproximava da 10ª, minha ansiedade e desejo aumentavam ainda mais, pois sabia que a recompensa seria infinitamente maior do que toda a energia despendida. Mesmo sendo amador, tenho disciplina como a de um atleta profissional. Durante o treinamento específico, me privo de vários prazeres da vida, como doces e outros tipos de alimentos gordurosos. Privilegio o repouso, procuro descansar adequadamente. Acordo muito cedo para treinar aos sábados, não tenho medo de encarar os desafios. Mantenho o meu sonho sempre muito vivo e, a qualquer momento, sei com clareza o motivo de eu estar fazendo todo aquele sacrifício. Enxergo sempre as recompensas e isso me impulsiona cada vez mais.

Como se “constrói” um ultramaratonista?

Nato – É lógico que se recomenda que a pessoa tenha um lastro de corridas de rua e também boas condições de saúde, mas eu prefiro colocar como pilares básicos a humildade, disciplina e determinação. Com esses valores, apoiados em um bom planejamento e orientação profissional, o atleta vai longe.

Pretende realizar feito semelhante em outras ultramaratonas do mundo?

Nato – Não pretendo fazer nada parecido. Um dos sonhos que eu tinha eu já realizei este ano: corri a Two Oceans, maravilhosa ultramaratona de 56 km na Cidade do Cabo, África do Sul, sempre realizada no sábado de Aleluia. O percurso tem um visual estonteante, de cinema. Os meus outros sonhos são: completar as famosas “Five Majors”, que são as maratonas de Nova York, Chicago, Boston, Londres e Berlin. Dessas, só faltam Chicago, Boston e Berlin. Correr o Desafio do Pateta, que consiste em fazer a Meia da Disney no sábado e a Maratona da Disney no Domingo.

Você vai estar na Comrades 2012?

Nato – A Comrades 2012, para mim, será a 1ª de mais 10 Comrades que irei fazer em busca do Double Green Number, honraria conquistada por raros corredores que cruzam a linha de chegada por 20 vezes, minha nova e ousada meta. Já decidi e não tem volta. Completarei 20 Comrades.

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