A Barreira dos 30 km

Atualizado em 12 de dezembro de 2017
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Em todas as escolas da Grécia é contada a história épica da Batalha de Maratona (uma planície a cerca de 40 km de Atenas), no ano 490 a.C., quando 7.000 guerreiros gregos derrotaram 20.000 invasores persas. Depois da batalha, um corredor solitário chamado Pheidippides foi enviado de Maratona a Atenas para contar ao povo o grande triunfo. Quando chegou ao centro de Atenas, completamente exausto, apenas conseguiu gritar “Ne niki kamen” (Ganhamos), para, em seguida, sofrer um colapso e morrer. Mitologia ou história real, ainda se discute a muito o surgimento desta modalidade esportiva, o que se sabe mesmo é que maratona se firma cada vez mais como um acontecimento esportivo das grandes cidades. Além de ser a prova clássica dos Jogos Olímpicos, ela fixou seu templo sagrado na cidade de Nova York onde, a partir de 1970, ela pára o trânsito e leva milhares de pessoas às ruas, que vibram pelos “desafiantes”.

Muitas são as dúvidas que assombram a cabeça de um atleta corredor de maratona, e uma frase muito comum ouvida durante este tipo de eventos e que ilustra muito bem estes questionamentos é: ” Estava indo muito bem até o km 30, depois não sei o que aconteceu !!! ” . A barreira dos 30 km já há muito tempo vem sendo estudada e trabalhada entre os atletas. Dentro de um contexto fisiológico, inúmeros aspectos podem assumir certa responsabilidade neste problema. São eles:

HIPOGLICEMIA

Estar em estado hipoglicêmico significa estar com os níveis de glicose (açúcar) no sangue abaixo do normal. A glicose é uma das principais fontes de energia para nossas células, sendo, para as células do Sistema Nervoso, a única e exclusiva fonte energética. Para as células, ficar sem energia (estado hipoglicêmico) por um tempo prolongado pode, além de possibilitar o aparecimento de fadiga precoce e comprometimento da performance provocar também danos severos e irreversíveis. Para garantir a manutenção da performance durante toda a prova evitando a instalação desse quadro, a glicemia deve ser mantida dentro de limites estáveis, o que se consegue através da ingestão de carboidrato (líquido ou sólido) realizada antes, durante e após a competição e/ou treinamento.

GLICOGÊNIO MUSCULAR

Outro aspecto de extrema importância a ser analisado e possível causador dessa barreira dos 30 km, é a queda do glicogênio muscular que pode ser definido como uma reserva de carboidratos que fica armazenada na musculatura e órgãos (como por exemplo, o fígado). É o glicogênio muscular o principal fornecedor de energia para prática esportiva além de atuar também na construção e manutenção do Sistema Muscular. A diminuição de substrato, associado a queda da glicemia (açúcar no sangue) é considerado uma das causas mais prováveis do aparecimento de fadiga após 90 minutos de prática esportiva. Fato importante a ser frisado é que segundo pesquisas, a manutenção do suprimento de glicose para os músculos deve prolongar o desempenho e retardar a fadiga, por isso a ingestão de carboidratos antes, durante e após o exercício pode melhorar o desempenho atlético, pela otimização das reservas de glicogênio muscular e hepático, ou através da manutenção da homeostase da glicose sangüínea. Dada a importância dos carboidratos para a performance de exercícios aeróbios de longa duração, recomenda-se que indivíduos que se exercitam regularmente devam consumir uma dieta entre 55%- 70% de seu total calórico na forma de carboidratos. Quanto ao tipo de carboidrato a ser consumido, glicose e sacarose são os que possuem uma maior capacidade de repor glicogênio muscular quando comparados com a frutose, nas 6 primeiras horas após o exercício em virtude de seu elevado índice glicêmico.

DESIDRATAÇÃO X HIPONATREMIA

Outro aspecto fisiológico que é alvo de inúmeras pesquisas e de muita preocupação é quanto ao equilíbrio hidroeletrolítico gerado pela hidratação adequada durante a realização das provas. Sabe-se que a desidratação resultante da perda pelo suor compromete o desempenho e funções fisiológicas importantes. Como resultado, é preciso ingerir líquidos durante o exercício para se reduzir o risco de problemas relacionados ao calor, manter as funções fisiológicas e melhorar o desempenho. Sabe-se também que o consumo de água excessivo pode provocar um quadro conhecido como hiponatremia, patologia que ocorre quando a concentração sangüínea de sódio atinge níveis abaixo da faixa de normalidade, causando um edema cerebral rápido, crises, coma e até morte. Com o objetivo de minimizar os risco tanto de desidratação quanto de hiponatremia, o American College of Sports Medicine recomenda a ingestão de aproximadamente 500 ml de fluidos aproximadamente 2h antes do exercício para promover a hidratação adequada e dar tempo hábil para a excreção do excesso de água ingerida. Segundo ACMS, durante o exercício, os atletas devem começar a ingerir líquidos com antecedência e a intervalos regulares (15 a 20 minutos) numa tentativa de consumir fluidos a uma taxa suficiente para repor toda a água perdida via suor (ou seja, perda de peso corporal) ou consumir a quantidade máxima que pode ser tolerada.

CÃIBRAS

Situação bastante comum na vida de um atleta é o aparecimento de cãibras, que pode ser entendida como uma contração involuntária, brutal e dolorosa de um grupo muscular geralmente devido a uma sobrecarga ou esforço muito grande. Existem diversos tipos de teorias que tentam explicar o para o aparecimento desse problema dentre eles podemos citar:

– Teoria metabólica, que se refere a intoxicação muscular por metabólitos, como por exemplo, acido lático.

– Teoria ambiental, onde as cãibras são geradas por modificações ambientais de temperatura.

– Teoria da desidratação

– Teoria de deficiência de potássio

– Teoria de deficiência de cálcio

Nesta situação, prevenir parece ser o melhor caminho para que o corredor não seja surpreendido, e o que se sugere neste caso é que o atleta beba quantidades suficientes de líquidos para ficar hidratado durante o exercício; reponha níveis de sódio durante os intervalos de exercícios pesados e transpiração abundante com uma bebida esportiva/isotônico e por fim assegure uma recuperação nutricional adequada (particularmente para o sal) e descanse os músculos após um treino intenso.

ÁCIDO LÁTICO

O ácido latico é um composto orgânico produzido naturalmente no corpo humano através do metabolismo da glicose. O lactato é encontrado no sangue, músculos e outros orgãos e é utilizado como um importante marcador bioquímico de Overtraining e/ou Estresse Crônico. Nos últimos anos, o uso do lactato sangüíneo, como indicador do estado de condicionamento físico, ou da intensidade de treinamento, ganhou grande impulso. Isto se deve, principalmente, à facilidade na obtenção e análise de amostras através de instrumentos semi-automatizados. Em particular, esta medição tem sido amplamente utilizada em exercícios aeróbios e anaeróbios. A acidose induzida pelo lactato é um importante fator de fadiga. Tem-se demonstrado que elevada lactacidemia (acúmulo de ácido lático) pode induzir a fadiga em exercício, independente do músculo em atividade. Para evitar este tipo de fadiga durante a prova, se faz necessário em primeiro lugar, determinar quais são seus limiares de treinamento, ou seja, até que ponto o atleta pode chegar sem que ocorra um aumento do nível do lactato que fuja da capacidade que o organismo possui de removê-lo. Para isso, o mais indicado é o teste ergoespirométrico que além de dados como VO2max e Freqüência Cardíaca Máxima determinarão também quais as zonas de treinamentos (limiares) que irão manter o atleta em uma faixa de corrida ideal para a realização da prova.

Equipe SportsLab
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-Dr. Sérgio Dias Reis
-Dr. Rogério José Neves
-Dr. Paulo Sérgio Barone
-Prof. Daniel Barsottini