Corrida em montanha é a oportunidade de elevar o astral

Atualizado em 04 de janeiro de 2017
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Corrida no asfalto é corrida. Corrida em montanha é corrida e muito mais. A cada prova dessa vertente mais rural e aventureira, mais e mais calouros ingressam nesse mundo com horizontes amplos, variação altimétrica maior, brisa, vento, riachos e cantos de pássaros. É bem verdade que parte dos corredores constata, em meio à lama, ter um vínculo forte mesmo é com as comodidades urbanas. São seres do asfalto, que não querem abrir mão da possibilidade de cumprir o pace idealizado, e têm forte compromisso com o cronômetro.

“A corrida de montanha é um esporte totalmente diferente da corrida no asfalto”, diz Sidney Togumi, ele mesmo um corredor de montanha que divide seu tempo com o trabalho em sua assessoria de corrida, a UPFIT. O dublê de corredor e treinador faz uso de uma comparação com o mundo das bikes para dar dimensão das dessemelhanças entre correr em ambiente urbano e em montanha. “É como comparar mountain bike com ciclismo de estrada. Correr em montanha exige outras capacidades. É necessário ter outro nível de força e de resistência para superar os obstáculos. É preciso trabalhar a musculatura para lidar com os riscos de torção de tornozelo, por exemplo, que são maiores”.

Mas nem tudo é desafio nesse universo mais bonito e verde, muitas vezes com cursos d’água. Quem gosta de utilizar a corrida como terapia certamente desfrutará de momentos em que o legal é…parar. Parar de correr para apreciar uma paisagem ou um bonito pôr do sol, do alto de uma pedra, é uma opção que existe para os praticantes de corrida em montanha.

 

 

Guia Completo para Corrida em Trilha: Tudo o que você precisa saber para aproveitar ao máximo a sua corrida é um livro assinado por Dagny Scott Barrios, escritora e palestrante especializada em corrida. Trata-se de um dos raros títulos disponíveis em português sobre corrida em montanha. Publicado em 2009 pela Editora Gente, oferece uma perspectiva feminina e mais sensível sobre os benefícios espirituais oferecidos por corridas nas alturas.

Barrios explica que não há nada de errado, quando se corre em trilha, se lhe der na veneta a decisão de interromper um treino ou até mesmo uma prova para sentar e refletir com a ajuda de uma bela paisagem. “Correr na trilha é uma dança, e você será conduzido pela trilha. Como em uma dança, quanto mais você se entregar, melhor”.

A autora norte-americana mistura essas tiradas filosóficas com argumentos capazes de convencer também aqueles corredores mais preocupados com desafios pessoais, incapazes de se desligarem dos compromissos que os prendem aos cronômetros. Um desses argumentos, bastante convincente, é o benefício que correr e competir em trilhas oferece a quem busca resultados no asfalto.

“Correr em trilha é um excelente treino para quem corre na rua. O concreto e o asfalto são duros para o corpo. Em trilhas, você irá ativar os pequenos músculos e ligamentos dentro dos pés e pernas. Ao envolver esses tecidos, você constrói e reforça sua rede de suporte físico, em vez de apenas pressionar seus ossos do metatarso (…)”, escreve Barrios.

A corrida em trilha está se desenvolvendo também como esporte competitivo de alta performance. O Congresso da IAAF (Associação Internacional de Federações de Atletismo) de agosto de 2014 reconheceu a modalidade.

Por esse motivo, pela primeira vez, a CBAt (Confederação Brasileira de Atletismo) se envolveu na convocação de uma equipe pare representar o país, no Mundial de Portugal, no ano passado. O treinador foi o próprio Sidney Togumi.

Nos arredores de Braga, numa belíssima região, a equipe brasileira masculina ficou em 13º lugar, em primeiro entre os países das Américas, à frente de Venezuela (14º) e Estados Unidos (15º). A soma dos tempos dos três melhores brasileiros resultou em 32h37min23s. Cada país foi representado por seis atletas. A França venceu, com 25h37min10s, e triunfou também no feminino. O percurso foi de 85km. Os resultados dos brasileiros que valeram foram de Cleverson Secchi, Francisco Santos e Hamilton Miragaia.

Wellington Bezerra, corredor especializado no asfalto, campeão do Circuito Caixa de 2016, tem boas lembranças de suas incursões na montanha. “Para o amador, a corrida em montanha é algo como uma brincadeira. Vai distrair a mente. É aventura, é algo que incrementa sua qualidade de vida, porque o corredor vai percorrer pasto de boi, vai passar por dentro de riacho, vai ouvir barulhos de bichos. É muito gostoso. Acho que é um ramo da corrida que vai pegar”.

Bezerra participou do Sul-Americano de Cajamarca, no Peru, depois de ter se destacado em alguns Campeonatos Brasileiros, em Monteiro Lobato e Santo Antônio do Pinhal (respectivamente, Vale do Paraíba e Serra da Mantiqueira, em São Paulo).

Ao encarar os 2750m daquele ponto da Cordilheira Oriental dos Andes, o pernambucano percebeu que o buraco “era mais em cima”. “Não fizemos uma preparação adequada. Chegamos na sexta para competir no domingo, não me adaptei à altitude. Além disso, sou muito alto para correr na montanha. Tenho 1,88m, pernas muito grandes. A alavanca do corpo é difícil, tenho que baixar muito o quadril”.

Como diz Togumi, no entanto, os corredores amadores, aqueles que nunca brigarão pela ponta, são os que mais curtem as montanhas. “Gosto das provas mais longas. Em subidas, trechos mais longos, consigo olhar e apreciar a paisagem. O efeito de terapia não é uma exclusividade da corrida em montanha. A corrida no asfalto também propicia isso. Mas esse bem estar é um bem exclusivamente seu, é particular do corredor. E cada um tem a opção de correr onde se sente melhor”.