Via Dutra

Atualizado em 23 de julho de 2010
Mais em

Por Cesar Candido dos Santos
Foto Erika Hofmann

Quando recebi o convite para acompanhar o grupo da Running Tour que sairia de São Paulo e iria de ônibus até o Rio de Janeiro para participar da maratona não pensei duas vezes e aceitei logo de cara. Afinal, sempre gostei de “pegar a estrada” e rodar centenas de quilômetros observando diferentes paisagens, ouvindo uma boa música, sentido o vento bater na cara e o sol queimar o braço que está do lado da janela. Além disso, fiquei curioso para saber como seria passar o fim de semana inteiro com pessoas desconhecidas, mas que tinham o mesmo objetivo que eu: correr.

A diversão já começou no táxi que peguei para ir até o local de embarque da viagem. Assim que entrei no carro o motorista começou a contar piadas e comentar sobre a vida. Como se fosse um velho amigo meu, ele revelou ter parado de beber e fumar há três meses, após ter encontrado uma mulher que mudou sua vida, e se mostrou empolgado em deixar o sedentarismo de lado e entrar para o mundo da corrida depois de saber que eu praticava o esporte.

No ponto de partida combinado, foi fácil notar que ali se encontrava um grupo de corredores. Só precisei olhar para os pés, calçados com tênis das mais variadas marcas e cores. Ainda do lado de fora, cumprimentos tímidos e acenos de cabeça entre aqueles que não se conheciam, mas bastou a porta do ônibus se abrir para o clima mudar. Um começou a ajudar o outro a colocar as mochilas no bagageiro e as pessoas passaram a interagir mais.

Por ser tarde da noite, rapidamente a maior parte do grupo adormeceu. O único barulho era o ronco do motor. Livros e um filme sobre as 50 maratonas completadas em 50 dias pelo ultramaratonista norte-americano Dean Karnazes distraíram aqueles que estavam acordados. Preferi olhar pela janela a estrada e as luzes dos carros que passavam. O sono não demorou a chegar, e aí começou uma verdadeira briga até encontrar uma boa posição para dormir. Virei de um lado, do outro e nada. Cochilava e acordava o tempo todo. Cheguei a sentir inveja daqueles que adormeceram profundamente.

O dia já estava claro quando chegamos ao Rio de Janeiro. Depois de uma noite no ônibus, a frase mais comum de se ouvir é: “Não consegui dormir direito”. Seria algo normal se não tivesse escutado isso daqueles que sequer abriram os olhos nas paradas feitas pelo caminho. Após deixarmos as malas no hotel, fomos para a feira da maratona retirar os kits. A turma toda já estava mais animada, fazendo piadas, brincadeiras e, é claro, conversando sobre a corrida.

O sábado pré-prova foi bem tranquilo. O grupo se dividiu pouco antes do almoço. Eu comi e fui para o meu quarto descansar. Parte da turma resolveu conhecer a Cidade Maravilhosa, mas o tempo nublado não colaborou muito com o passeio deles. À noite todos se reuniram novamente no ônibus, desta vez com destino ao jantar de massas. Em menos de 24 horas todos pareciam amigos de longa data. As conversas já não se restringiam apenas à corrida, e os assuntos também eram sobre trabalho, cinema, livros, namoradas, viagens, futebol e outros esportes.

O dia da prova amanheceu com uma fina garoa. Antes das 6 horas da manhã todos já estavam prontos. Ninguém falou muito durante o trajeto até a largada, não sei se pelo nervosismo antes da competição ou por ainda ser muito cedo. Preferi me separar do grupo e aguardar sozinho o tiro de partida da meia-maratona. Meu desempenho foi exatamente dentro do planejado* e, como nosso hotel era próximo da linha de chegada, completei os 21 km e decidi ir direto tomar um banho para trocar a roupa molhada. No elevador encontrei uma família que havia acabado de tomar café da manhã. Quando me viu com a medalha no peito, o pai perguntou se eu tinha vencido a corrida. Sorri e respondi que desta vez não, sem saber que tempos depois entraria no mesmo elevador uma verdadeira campeã, já que, Sirlene Pinho, primeira colocada nos 42 km, estava hospedada no andar acima do meu.

No retorno para São Paulo aconteceu algo que só é possível na corrida. Enquanto alguns comemoravam ter completado a primeira maratona em 5h ou melhorado o recorde pessoal em 10min ao cruzar a linha de chegada em 4h, um companheiro de viagem lamentava a “péssima” marca de 3h20min e buscava explicações por não ter conseguido fazer os 42 km abaixo de 3h. Bastou o ônibus entrar na estrada para boa parte da turma cair no sono. Foram mais 6 horas de viagem até chegar o momento de me despedir dos amigos com quem dividi bons momentos no fim de semana. Provavelmente encontrarei muitos deles nas corridas por este Brasil afora, outros talvez eu nunca mais veja, mas isso é normal para quem vive na estrada…

*Nota do editor: 1h39min45s, nada mal mesmo para uma estreia na meia.