Sobrevivente da Ultra Maratona conta seu martírio

Atualizado em 13 de abril de 2009
Mais em

Graças ao dom da vida, da esperança e da superação dos próprios limites, extenuado depois de onze horas pedalando sem parar, chego à cidade de Tambaú, cumprindo uma promessa feita a mim mesmo: desistir jamais! Competir sempre!

Rumo ao Caminho da Fé de Metrô e ônibus
Para que você entenda bem este relato leia o primeiro artigo  sobre o tema. Então, devido às características da Ultra Maratona no Caminho da Fé, que começava em Bonfim Paulista, distrito de Ribeirão Preto, que terminava o primeiro dia de prova em Tambaú (108 km) e concluía a segunda etapa no dia seguinte em Vargem Grande do Sul (64 km), em vez de carro, fui de transporte público.

Metrô & ônibus
Em horários determinados o Metrô e seus funcionários recebem muito bem o biker em suas estações, bastando para isso, obedecer 16 instruções bem básicas e chegar à rodoviária do Tiete em São Paulo. No caso, embarquei com destino a Ribeirão Preto, e da mesma forma que no metrô, não encontrei maiores impedimentos para colocar minha amada bike no compartimento de bagagens, sinal que esses órgãos já compreendem que nosso meio de locomoção e diversão deve ser levado a sério.

A largada em Bonfim Paulista
Da minirodoviaria de Ribeirão Preto, levando uma mochila extra com meus pertences, percorro quinze quilômetros até a igreja matriz do distrito e percebo que a Time MKT Esportivo, organizadora do evento, leva a sério mesmo a prova. Lá estava montado um pórtico alusivo ao evento e o Marcelo Coelho, organizador e locutor oficial da prova, dava as instruções e informava dos diversos pontos de apoio, além de uma ambulância que seguiria os competidores, a fim de garantir qualquer eventualidade.

Ultra Maratona no Caminha da Fé: Só para quem pode!
Calma que você vai entender a razão do subtítulo. Em razão dos 108 km iniciais, só 41 competidores, ou seja, aqueles que tem dentro de si o verdadeiro espírito de superação apresentaram-se.

Note meu caro leitor, que em qualquer competição em que exista as categorias Pró e Sport, a primeira recebe não mais que vinte por cento dos atletas inscritos, e numa competição dessas não seria diferente.

Ser Pró significa encarar dezenas de quilômetros a mais de percurso, centenas de metros adicionais de diferenças altimétricas, além de singles tracks irados entre outros obstáculos do gênero.

O suplicio na Fé
Dada a largada, pude perceber que a sinalização do percurso se daria pelas setas amarelas indicativa aos peregrinos.

Só que tem um problema: elas foram instaladas para pessoas a pé e não de bike, e estavam pintadas em postes, placas, árvores, etc, a dois, três metros do solo, dificultando sua visualização. Lógico que já durante o primeiro percurso, errar por alguns quilômetros o trajeto foi a tônica para a maioria dos competidores, apesar de que ajudados pelos motos-batedores todos eram orientados, mantendo a organização o total controle da segurança dos competidores.

Os problemas começaram a aparecer lá pelo quilometro setenta, em meio a um single track entre diversos sítios, por causa de dificuldade de visualizar a sinalização, além de vacas, cavalos, brejos, paredões, e toda ordem de obstáculos até voltar a uma difícil trilha. Antes, já havia “dado um perdido” de uns oito quilômetros e despencado uns trezentos metros para baixo, sem necessidade. E você sabe: tudo que se desce se tem que subir sem dó nem piedade.

Aí já estava anoitecendo…

O anjo Marcio Gabriel
Depois de espantar um simpático senhor lá pelo quilômetro 40, que queria que eu subisse para o ônibus de resgate, só porque eu estava em último, percebo a chegada de um moto-batedor da organização, junto a um carro de apoio, e começaram a me perseguir.

Quando a duras penas consegui ultrapassar o single track e vendo que a noite iria chegar, comecei a gostar da déia de ver que o motociclista ainda insistia acompanhar-me, pois assim chegaria numa boa; grande engano!

Em uma parte do single, ainda retribui a gentileza, ajudando-o a desencalhar a moto que havia afundado em uma das tantas erosões e a camaradagem se fez presente.

O tormento de mais de 30 km de areião!
Farol na bike instalado, cansado e ajudado pela iluminação adicional do meu anjo da guarda, o Marcio Gabriel, comecei a dar-me contar do martírio que viria pela frente: dezenas de quilômetros de areião, que fazia com que até a moto tivesse dificuldades em trafegar. Então, imagine uma bike, com um competidor mediano em cima!

Na escuridão, não sabia da velocidade instantânea, média, percurso concluído, faltante; não sabia nada.

Só sentia a intensa presença do meu anjo, que me dava ânimo para seguir em frente, iluminado também por uma lua cheia que não mais esquecerei.

Foram horas de pedal, contando com a ajuda iluminada da moto do Marcio Gabriel. Quando minhas últimas forças já se estavam exaurindo, esperança ao ver as primeiras luzes da cidade de Tambaú, deram o último alento que precisava.

Extenuado, mas feliz como um biker de ATITUDE deve estar!

Finalizo a primeira etapa, depois de onze horas de provações de toda espécie. Como não esperava que o percurso fosse tão duro, não havia levado nutrientes adequados para uma queima tão grande de calorias, apesar de não haver me descuidado nem um minuto de hidratar-me o melhor que podia, senti que não decepcionei a mim mesmo, pois havia cumprido a parte que é e será a mais dura das etapas desta temporada.

As desistências e os desistentes

Observe os resultados deste dia memorável e verás que muitos desistiram antes do término da primeira etapa, por exaustão mesmo. Outros, eu entre eles, decidiram por bem não estar entre os que largariam no dia seguinte para a segunda etapa, por razões de condição física inadequada. Então, tomo a defesa destes e digo que pedalar é preciso, mas é necessário juízo para optar por não continuar.

É um imperativo de um biker de Atitude, que sabe o momento de lutar ou de dar uma trégua. Na próxima estaremos todos de volta. Podem conferir e cobrar depois.

Competição para os TOP 10
Levo grandes lições desta magistral competição. Dentre muitas, destaco algumas que ficarão na memória dos 41 heróis do dia:
• Se o biker quiser pedalar na categoria Pró: Ultra Maratona no Caminho da Fé!
• Participar do Cape Epic ou competições do gênero pelo mundo afora: Ultra Maratona no Caminho da Fé!
• Estar entre os cinco primeiros de qualquer categoria: Ultra Maratona no Caminho da Fé!
• Ser um biker de ATITUDE: Ultra Maratona no Caminho da Fé!
• Saber o que é superação: Ultra Maratona no Caminho da Fé!

Eu fui, pedalei como nunca na vida, senti o que é estar em uma prova bem organizada, além de receber um apoio que preservasse minha integridade física e mental, ao concluí-la senti que vale a pena competir, mesmo não sendo um atleta.

Agora só falta você… Espero-te meu camarada!

Por fim, deixo registrado o dizer de um enorme cartaz em meio ao caminho:

“Que o caminho seja brando a teus pés,
o vento sopre em teus ombros,
o sol brilhe cálido sob tua face
e as chuvas caiam serenas em teus campos,
até que eu de novo te veja.”

“QUE DEUS TE GUARDE NA PALMA DE SUA MÃO.”