Sempre a mil

Atualizado em 04 de maio de 2006
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POR FELIPE MENDES

“Independentemente do que for acontecer comigo, quero lhe fazer um pedido. Cuide bem de sua irmã e sua mãe e jamais largue o automobilismo”. Esta foi a última frase que Antoine Rizkallah Kanaan Filho, o Tony Kanaan, ouviu antes de seu pai morrer, quando tinha somente 13 anos. E levou a sério. Depois de ter sido campeão da Fórmula Indy em 2004 e vice-campeão em 2005, o piloto está em uma ótima fase, e pensa nas 500 milhas de Indianápolis, que vai disputar em maio.

Kanaan nasceu em Salvador no dia 31 de dezembro de 1974, mas logo foi para São Paulo. Aos 10 anos de idade ele teve o primeiro contato com o início de sua carreira: foi apresentado ao kart pelo pai, seu incentivador e patrocinador desde o início. “Fiquei louco, alucinado com aquilo e sabia que minha vida estaria relacionada com aquele barulho”. No ano seguinte, Kanaan já estava dentro de um carro barulhento e ganhou o prêmio de piloto-revelação em 1985 e os cinco títulos paulista, entre 1986 e 1990, nas categorias júnior, B e graduados A.

Depois que o câncer levou seu pai, Antoine Rizkallah Kanaan, em 1987, foi a mãe, a baiana Miriam Kanaan, que ajudou a levar adiante o sonho que agora também era do filho. “Era única mãe que estava em todas as corridas, acompanhando tudo e decidindo bastante também”. Mas, nessa época, a condição financeira da família despencou. Sem querer deixar para trás o pequeno carro, Kanaan chegou a dar aulas de pilotagem e trabalhar em uma fábrica de karts, para sustentar sua paixão. Em 1993, graças aos bons resultados na corrida, Kanaan deu mais um passo na sua carreira e foi competir na Europa, já com patrocínio.

Entre as vitórias mais marcantes, destaca o campeonato da Indy Lights em 1997, o GP dos Estados Unidos, disputado em Michigan em 1999 e, a maior delas, a conquista de 2004.

Fora do Carro
No entanto, não adianta somente ser um bom piloto e ter um bom carro para vencer. “Desde pequeno, sempre fui orientado que meu bom condicionamento físico seria primordial para ser campeão no automobilismo”. Segundo ele, quando se está a 400 km/h, qualquer desatenção – e o cansaço também ajuda nisso – é “muro na certa”. Assim, para que seu rendimento seja máximo dentro do carro, Kanaan deve se exercitar muito fora dele. “Quando não tenho corrida no final de semana, eu treino todos os dias, menos às sextas”. Treinado por Marcos Paulo Reis, o também praticante de triathlon, cuja modalidade preferida é o ciclismo, faz uma ressalva: “tudo começou na corrida a pé.


Kanaan e a bike (foto:divulgação)

A primeira etapa de um dia de treinos, a bicicleta, começa às 6h da manhã e dura no máximo até as 9h. “Chego a pedalar cerca de 120 km por dia”. E não pára por aí. À tarde vem a natação e mais tarde, por volta das 19h, Kanaan intercala corrida e musculação.

Para quem está acostumado a correr em alta velocidade, a corrida de rua pode não parecer tão emocionante. Porém, segundo Kanaan, nem sempre tudo é competição. Além disso, enquanto no automobilismo é essencial a dedicação de cerca de cem pessoas para que se chegue ao pódio, na corrida “é uma questão mais individual. Você precisa superar seus limites assim como no automobilismo, mas está em contato com a natureza”.

Mesmo quando não está em Miami (EUA), onde mora, ou no Brasil, Kanaan tenta encontrar lugares para correr a pé, sejam as academias dos hotéis em que se hospeda ou mesmo alguma rua ou parque da cidade. Um lugar que o piloto considera especial para a prática do exercício é Motegi, no Japão, “o autódromo é muito grande, e a pista fica no meio das montanhas. A corrida a pé na região é muito bonita, pois tem inúmeras atrações para você poder olhar e passar o tempo”.

Kanaan se considera no auge de sua forma física, fruto de uma intensa dedicação. “Meu treino é igual ao de alguém que compete profissionalmente como triatleta”. Sempre que a agenda permite, ele participa das mais diversas competições. Desde maratonas ciclísticas, como o Extra Distance (prova anual de 800 km em São Paulo), a um meio Ironman, de triathlon.


Kanaan finaliza prova de Triathlon
(foto:divulgação)

Além do desgaste dentro e fora do carro, o piloto deve fazer uma alimentação balanceada. Segundo ele mesmo, suas refeições são repletas de saladas, vegetais e grelhados. “É muito difícil eu comer fritura e molhos muito gordurosos”.

Longe de pensar em abandonar o carro ou pendurar as “chuteiras”, Kanaan segue buscando títulos para o Brasil. Supersticioso, ele revela que mantém um ritual de boa sorte: sempre calça primeiro o pé direito dos sapatos e sempre entra pelo lado esquerdo do carro. E, acima de tudo, continua a realizar o último pedido do pai.