O homem por trás da São Silvestre

Atualizado em 16 de dezembro de 2011
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Por Ricardo Bassani

Thadeus Kassabian está à frente da Yescom Entretenimento, Esportes e Comunicação, responsável pela organização da mais famosa corrida de rua do Brasil: a São Silvestre. A empresa organiza também as Meias de São Paulo e Rio de Janeiro e a Maratona de São Paulo, a Volta da Pampulha e cerca de outros 50 eventos anuais.

Ligado diretamente ao crescimento do número de praticantes e ao mercado de corridas de rua, Kassabian é personagem importante nas decisões quando os assuntos são inovações e mudanças nas provas para adequar essa demanda. É o caso do novo trajeto e local de chegada da São Silvestre, que gerou campanhas, mobilizações e até protestos por parte de corredores insatisfeitos, que pregam pela manutenção da tradição do evento. De outro lado, porém, estão os que aprovam as mudanças, já que a corrida já teve cerca de 24 mil das 25 mil vagas preenchidas.

É justamente sobre esse, e muitos outros assuntos relacionados, que ele responde, com exclusividade, a esta entrevista:

O2 POR MINUTO: O que é mais forte na tradição da São Silvestre: origem (1924, inspirada no exterior), persistência (nunca foi interrompida, nem pela II Guerra), fama internacional (vitória de Emil Zatopek, em 1953 contagiou maratonistas), época do ano (réveillon) ou localização/percurso (proximidades Avenida Paulista)?

Thadeus Kassabian: A frequência e a data.

O2: A principal reclamação quanto à mudança do percurso da São Silvestre 2011 é a perda da tradição (chegada na Paulista). Que outras soluções foram descartadas e por quê? Vocês cogitaram começar a prova mais cedo, para que não “cruzasse” com o réveillon?

TK: Como dito acima, as tradições mais lembradas são a história, a frequência e, principalmente, a data. A São Silvestre já mudou de percurso 12 vezes. Também temos recebido vários pedidos para passar a prova para o período da manhã. Quanto a isso, vamos fazer uma pesquisa e avaliar em janeiro.

O2: A organização acredita que somente a mudança do percurso será suficiente para descongestionar a chegada, que coincidia com a festa de virada de ano, e permitir o crescimento da prova?

TK: Neste momento, o primeiro passo é buscar um equilíbrio no atendimento aos corredores no pós-prova. A área que será utilizada é muito maior, e o primeiro teste é trabalhar com 25 mil participantes. Mas o foco não é crescer, e sim poder dar a assistência necessária ao corredor.

O2: Outras grandes e tradicionais corridas de rua pelo mundo também adaptaram ou modificaram detalhes de percurso e horários. Qual seria a prioridade no caso da São Silvestre: corredores, transmissão ao vivo, concentração de público, altimetria, normas internacionais, disponibilidade da via pública etc?

TK: Nesta ordem: segurança e conforto, atendimento às normas do esporte e ao atleta no pós-prova, equilíbrio da altimetria com a manutenção dos 15 km e manutenção do percurso histórico. Todos estes aliados à disponibilidade de vias públicas e sincronismo com a cidade, usuários e os eventos.

O2: Qual o peso dos principais envolvidos nas decisões para mudanças na São Silvestre entre Yescom, Fundação Cásper Líbero, CBAt (Confederação Brasileira de Atletismo), CET, Prefeitura e emissoras com direitos de transmissão de imagens?

TK: Todas as necessidades são apresentadas em reuniões periódicas aos órgãos públicos através da Fundação Cásper Líbero. Para qualquer decisão é necessário o aval coletivo, considerado de acordo com critérios técnicos. Uma vez encontrada uma solução, que no casso era buscar um local mais espaçoso para a chegada, todos são envolvidos até que se decida. A última palavra é da Fundação Cásper Líbero.

O2: Existe a possibilidade de mudar o horário da prova (como em 1989: das 23h30 para 15h/mulheres, e 17hs/homens). Isso para uma condição mais favorável ao atleta, por causa da temperatura e aproveitamento da própria estrutura montada na Avenida Paulista?

TK: Como já coloquei, recebemos pedidos para que a São Silvestre seja pela manhã. E vamos fazer uma enquete.

O2: Existe a possibilidade de mudança de data, mobilizando a Avenida Paulista (e estrutura montada) para dia 30, disponibilizando toda a área para corredores e organização em qualquer horário?

TK: Não. O dia de São silvestre é dia 31/12. É tradição!

O2: Que sugestão você dá ao corredor para se transportar de volta para o lugar da largada da prova, já que ela terminará quase três quilômetros de distância do início, no Ibirapuera?

TK: Minha sugestão é o processo invertido. Ou seja, buscar locais próximo da chegada, e ir em direção da largada, antes da corrida. Sobre os locais onde estacionar, sugiro sempre pesquisar no site da CET o plano viário do dia. As estações de metrô são outra alternativa (verificar horários, embarque e desembarque alterados). Há também linhas de ônibus, e entendo que haverá um caminho tranquilo de retorno.

Vale ressaltar que há um plano específico de estacionamentos na região por conta do réveillon, quando também muitas vias serão interditadas. Justamente um dos pontos de conflito dos eventos era o acesso do público ao réveillon, com a chegada dos corredores da São Silvestre em mesmo horário.

O2: Os corredores devem tomar mais cuidados com este percurso? Iniciantes não correm mais risco de lesão por conta das duas novas descidas do trajeto?

TK: O perfil altimétrico deste ano demonstra um resultado mais favorável para o percurso. A Brigadeiro tem um pedaço mais intenso, porém é mais suave em toda a maioria de sua extensão. A Major Natanael tem a mesma característica. O percurso foi aprovado pelos medidores internacionais da IAAF (Federação Internacional de Atletismo) e CBAt, e tem características similares ao das grandes provas internacionais, também com um conteúdo histórico interessante. O Pace Chart (gráfico de ritmo) indica, inclusive, uma possível redução de tempo no pelotão da elite. Atletas de renome Mundial, como o Marilson Gomes dos Santos e o Martin Lel estudaram o percurso antes de confirmar presença.

Quanto às lesões, entendo que cada atleta deve conhecer o seu real potencial, treinamento e capacidade no período. O que eu sempre índico a todos é a realização de exames médicos periódicos, consultas a um treinador que tenha conhecimento e CREF e respeito ao próprio limite. Da mesma forma que organizar um evento requer meses de planejamento, e não é só dar a “buzinada” e esticar a faixa de chegada, o corredor também precisa de planejamento. Acho que a Comrades (ultramaratona na África do Sul) pode até ser um exemplo de prova com declive.

O2: Fazer a dispersão da provas nas vias laterais da Paulista, como é feito em algumas grandes maratonas do mundo, chegou a ser cogitado para evitar aglomerações na avenida? Essa solução daria certo na São Silvestre?

TK: Sim, foi cogitado. Porém, para isolar as laterais teríamos que isolar o acesso de somente (e tão somente!) seis hospitais. Também há a convergência do público do réveillon, que acabaria não chegando para a festa a tempo. Várias situações foram cogitadas em dois anos.

O2: A São Silvestre receberá neste ano 25 mil participantes, e o plano é chegar a 40 mil. Que mudanças ainda são necessárias para comportar quase o dobro de inscritos?

TK: Vamos dar um passo de cada vez e avaliar o resultado.

O2: A população diária na Avenida Paulista já é maior que a de municípios como a Praia Grande, por exemplo. E o réveillon, ou Virada na Paulista (desde 1996), já bateu recorde de 2,4 milhões de pessoas em 2008. Não seria o caso de a festa (bem mais nova que a São Silvestre) mudar de lugar? Sambódromo, por exempl
o?

TK: Este tema é uma decisão da Prefeitura de São Paulo. Entendo que os dois eventos são importantes para a cidade. Ambos cresceram, e descentralizar a chegada da São Silvestre é uma ação boa para todos, inclusive como opção de lazer.

O2: O crescimento da corrida de rua (mais de quatro milhões de praticantes no País), traz consigo o problema dos “pipocas”. O índice desses não-inscritos na São Silvestre chega a 20%. Como trabalhar esse problema quando o número chegar aos 40 mil corredores?

TK: Acho que este ano, por conta da abertura de mais cinco mil vagas, diminuirá a quantidade de pipocas. Muita gente corria nessa condição porque ficava sem inscrição.

O2: A Yescom colabora de alguma forma com o COB com a realização dos Jogos Olímpicos de 2016? A Rio Maratona Pro (9 de setembro) seria um exemplo?

TK: A maratona foi um pedido específico de um parceiro da Yescom. A Yescom é a única empresa no Brasil que participou de dois Jogos Panamericanos, dando suporte à Corrida de Rua, e realizou o Campeonato Mundiais de Corrida de Rua na Meia-maratona do Rio. Será um evento em circuito para até quatro mil participantes com índice técnico, no formato que será realizado em Londres. Esta é uma tendência mundial.