Cláudio Clarindo fala da sua jornada na RAAM 2011

Atualizado em 12 de julho de 2011
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A Race Across America (RAAM) não é uma prova para qualquer ciclista. O processo de qualificação é duro e a categoria solo reúne poucas dezenas de atletas. E é necessário que assim seja, pois o desafio consiste em pedalar ininterruptamente cerca 4.900 km, cruzando os Estados Unidos de costa a costa, com os mais diferentes tipos de terrenos e climas, de deserto a altas montanhas.

O ultraciclista santista Cláudio Clarindo (Tour do Rio/ Grupo Pão de Açúcar), 33 anos, tem seu nome na história da prova por diversos feitos e, no último dia 26 de junho, acrescentou mais um capítulo nas memórias da RAAM. Nesta terceira vez que completou a Race Across America, Clarindo bateu o recorde latino-americano nos 4,9 mil quilômetros, com o tempo de 10 dias 15 horas e 49 minutos, sete horas a menos que o seu próprio recorde latino-americano, cruzando a linha de chegada em Annapolis, Maryland, na 12ª posição.

Em 2006, Clarindo completou a dura disputa em 11 dias, 18 horas e quatro minutos para ser o primeiro latino-americano a concluir a prova na categoria solo. Em 2009, cruzou a linha de chegada da RAAM em 10 dias e 22 horas.

“A organização fez uma prova de tirar o fôlego, passando pelos pontos mais difíceis dos Estados Unidos, como montanhas com 12 mil pés de altitude, com temperatura de menos três graus, literalmente no gelo, além de desertos do Arizona e Utah, com os termômetros marcando 49 graus”.

Este foi o ano que a prova largou com mais participantes, com 50 ciclistas, e apenas dois desistiram. “Consegui me manter num primeiro pelotão, onde estavam todos os melhores ciclistas de longa distância do mundo, sobretudo os europeus, que vieram muito preparados para a disputa”, complementou o atleta, que junto com Tour do Rio e Grupo Pão de Açúcar, pedalou com os patrocínios de Shimano, Specialized, 3T Cycling, VO2 Max, Roldão, Oakley, Continental e Fizik.

Porém, a jornada até a RAAM 2011 (e o novo recorde) não foi percorrida em um caminho florido. Clarindo concedeu em primeira mão ao ativo.com uma “entrevista de desabafo”, como ele mesmo disse, ressaltando coisas que ainda não havia dito, principalmente com relação ao descaso e o desprestígio com o atleta nacional.

Muita comemoração pelo novo recorde latino-americano na RAAM?

Clarindo – Em primeiro lugar vou falar da falta de valorização que ainda recebo, poucas são as pessoas que conseguem dimensionar no Brasil o que é uma Race Across America, e o que representa você conseguir completar a prova em 10 dias e 15 horas. Depois da prova recebi alguns e-mails dizendo: “Que legal você completou a prova, mas piorou a qualificação!”. Depois de tudo que eu passei nestes anos para sempre ir a RAAM e completar por 3 vezes e sempre melhorar meu desempenho, este tipo de comentário não me abala, mas não escondo que me sinto triste, pois quando estou nos Estados Unidos sou considerado um dos melhores ciclistas do mundo em longa distância, mas em meu país sinto que ainda a valorização está longe de ser apresentada.

Em 2011 eu tive que travar uma verdadeira guerra na batalha por posições na RAAM, vários ciclistas europeus de qualidade estavam presentes, dentre outros americanos. Fiquei muito contente de ter abaixado o recorde latino-americano em 7 horas e estar bem próximo dos 9 dias na RAAM.

Estou abrindo um caminho no ciclismo de longa distância do Brasil no exterior e me sinto honrado de trilhar este caminho, como Daniela Genovesi também vem fazendo e já o fez com sua vitória na elite feminina da prova em 2009. Hoje somos muito respeitados neste segmento no exterior e poucos sabem disso! Mas isso é uma mágoa que vem de tempos já. Não é este motivo que irá tirar o foco de meus ideais e meus objetivos. Sou cabeça dura e casca grossa!

Como foi a RAAM este ano, com um dos times na solo mais competitivos de todos os tempos?

Clarindo – Como sempre fui com uma equipe de amigos e somente consegui meus patrocinadores no último minuto! Foi desesperador, mas consegui ir e colocar minha mente junto a equipe e superar a RAAM 2011, que foi uma das mais difíceis de toda a história. Agradeço demais aos meus patrocinadores e apoiadores por sempre acreditarem em meu potencial! O Tour do Rio teve uma grande importância no meu projeto, bem como o Grupo Pão de Açúcar, que acreditou fielmente em minha proposta de conclusão.

A prova saiu dentro dos seus planos? Alguma dificuldade inesperada?

Clarindo – Saiu sim! E fiquei surpreso com toda a logística, a prova depende muito de uma logística eficiente e posso afirmar que carrego um fardo enorme ANTES da prova, para poder completá-la. A dificuldade foi que, neste ano, os organizadores complicaram e muito o percurso, colocando uma quantidade absurda de montanhas. Não vou me esquecer que no Colorado, em Rock Mountains, realizei a subida num vento contra absurdo e pedalei por muito tempo com 6 milhas por hora, foi muito incrível, pois estava disputando posição com um ciclista americano e ele estava a 5miles/hour. Fiz uma força descomunal!

Em termos de percurso, qual foi o pior trecho?

Clarindo – Uma cadeia de montanhas à noite, em West Virginia, nunca passei tanto frio e subi tanto em toda minha carreira! Foi dificílimo.

Como foi sua preparação este ano para a prova?

Clarindo – Estava treinando há muito tempo e este ano fundei a CLR Cycling Team, um grupo de pessoas que ama pedalar, e tenho grandes alunos que realizaram treinos épicos comigo. Aos meus alunos o meu muito obrigado… Meu desafio no velódromo do Rio me ajudou bastante também! Aliás, este será um de meus objetivos para 2012, bater 770 km no Velódromo em menos de 24 horas.

Volta para a RAAM em 2012?

Clarindo – Vou voltar a RAAM com toda certeza! Mas vamos estudar mais logísticas e conseguir mais patrocinadores para esta gigante prova. Quando estou nos Estados Unidos vejo que os americanos não acreditam no que fazemos e aqui no Brasil as pessoas acham que pegamos carona nos carros! Mas, vamos lá! Eu acredito na valorização em algum momento!